E continuamos
fiéis à nossa proposta de, à terça e à sexta de cada semana deste mês de maio, descobrir
um bocadinho da literatura, da história e das belezas de cada um dos nove
Países que integram a CPLP, a Comunidade
de Países de Língua Portuguesa. Assim, hoje, e por ordem alfabética…
GUINÉ-BISSAU!
Oficialmente
República da Guiné-Bissau, este país da África Ocidental faz fronteira com o
Senegal a norte, Guiné a sul e a leste e com o Oceano Atlântico a oeste. O
território guineense abrange 36.125 quilómetros quadrados de área, com uma
população estimada de 1,6 milhão de pessoas.
A
Guiné-Bissau fazia parte do Reino de Gabu, bem como parte do Império do Mali.
Partes deste reino persistiram até ao século XVIII, enquanto algumas outras
ficaram sob o domínio do Império Português, a partir de 1446, quando o
português Nuno Tristão se tornou o primeiro navegador e explorador europeu a
chegar à sua costa. Porém, a colonização só começou em 1558, com a fundação da
vila de Cacheu.
No
século XIX a colonização foi intensificada e, mais tarde, durante o Estado Novo
de Salazar, a colónia passará a ter o estatuto de província ultramarina, com o
nome de Guiné Portuguesa.
Após
a independência, declarada em 1973 e reconhecida em 1974 (primeira colónia
portuguesa no continente africano a ter a independência reconhecida por
Portugal), o nome de sua capital, Bissau (fundada em 1687, como fortificação
militar e entreposto de tráfico de escravos, tornar-se-ia a capital colonial em
1941, estatuto que manteve após a independência), foi adicionada ao nome do
país para evitar confusão com a Guiné (a antiga Guiné Francesa) e a Guiné
Equatorial (antiga Guiné Espanhola).
Apenas
15% da população fala o português (como primeira ou segunda língua),
estabelecido como língua oficial durante o período colonial e que assim continua.
A grande maioria da população (90,4%) fala crioulo, uma língua baseada no
português, ou variedades de línguas africanas nativas.
A sua
bandeira, como algumas outras em África, baseia-se nas três cores (verde,
vermelho e amarelo, as chamadas cores pan-africanas, em favor da liberdade e da
unidade africanas) da bandeira da Etiópia (cores essas que simbolizavam inicialmente
as três pessoas da Santíssima Trindade: Pai, Filho e Espírito Santo) mais a estrela
de cor preta, a “Black Star Line” do ativista afro-americano Marcus Garvey, uma
companhia de navegação que existiu entre 1919 e 1922, para transportar afro-americanos
dos EUA para se estabelecerem em África.
Com a
ilustração seguinte, vamos dar-te a conhecer um conto tradicional deste povo:
Misá |
GUINÉ-BISSAU
É no Fogo que eu Nasci
“Havia
a Lebre, a Hiena e o Esquilo. A Hiena tinha um campo de amendoim e o Esquilo
costumava convidar a Lebre para irem lá roubar. Iam todos os dias para o campo
da Hiena e ficavam lá a comer-lhe o amendoim.
Um dia
a Hiena saiu para ir dar uma volta pelo seu campo e reparou que já não havia
quase metade da colheita.
Não
fez mais nada: foi à procura do caminho por onde os ladrões vinham e quando o
descobriu armou um laço no meio do caminho para apanhar os que a andavam a
roubar.
Mas a
Lebre é esperta. Na vez seguinte aproximou-se com muito cuidado... e acabou por
ver o tal laço. Foi logo contar ao Esquilo:
–
Han! Já viste? A Hiena pôs ali uma corda para nos apanhar por isso agora temos
que mudar de caminho, vamos passar a ir à mancarra por outro caminho.
Assim
fizeram, foram por outro caminho. E á se puseram a comer amendoim, a comer
amendoim, a comer amendoim...
De
repente viram vir a Hiena!
Esperaram
até que a Hiena chegasse e desataram a correr.
Bom...
A Lebre, esperta como era, reparou que a corda que a hiena tinha posto era
muito fraca. No dia seguinte voltou. No dia seguinte a Lebre voltou mas trazia
um djidiu.
Combinou
com o djidiu que, quando a Hiena aparecesse, começasse a cantar:
Foste ferida
Solta a mão e corre
A Hiena prendeu-te e feriu-te
Solta-te e foge.
Foste ferida
Solta a mão e corre
O laço da mãe Hiena feriu-te
Solta-te e foge
Quando
a Hiena chegou perto, o djidiu iniciou o seu canto — o djidiu era o Esquilo. A
Lebre começou a correr e meteu-se dentro do laço! Mal pôs o pé o laço apanhou-a
imediatamente. Mas como o laço era fraco, ela esperneou, esperneou, tanto
esperneou que acabou por cortar a corda! Desatou a correr e desapareceu.
Tempos
mais tarde... A Lebre voltou a aparecer. A Hiena voltara a pôr outro laço. Mas
a Hiena, que é burra que se farta, naquele tempo não havia corda e o algodão
não serve para fazer cordas — se se molha um bocadinho só, parte-se logo —,
torceu um bocado de algodão e fez assim o laço. A Lebre apareceu, viu que era algodão
torcido e voltou-se para o djidiu:
– Bom
já podes – para que começasse a tocar. O djidiu começou a tocar:
Foste ferida
Solta a mão e corre
A Hiena prendeu-te e feriu-te
Solta-te e foge.
Foste ferida
Solta a mão e corre
O laço da mãe Hiena feriu-te
Solta-te e foge
A
Lebre começou a correr outra vez e meteu o pé no laço. O laço prendeu-a logo.
Esperou que a Hiena se aproximasse, esperneou um bocado, partiu a corda e foi à
sua vida.
A
Hiena pensou, pensou até que... um dia foi à procura de arame, enrolou-o muito
bem em algodão mesmo até cá em cima, e foi pô-lo lá.
A
Lebre chegou, não deu muita atenção, só viu o algodão e disse logo:
– Ee!
Hoje vou partir esta corda mais depressa, ela nem sequer a torceu. Vou esperar
até ela chegar mesmo perto de mim para começar a correr e meter-me lá dentro.
E
pôs-se logo a correr. O Esquilo também comia por outro lado. Quando reparou que
se tinha que pôr a tocar, a Hiena já estava em cima deles. O Esquilo fugiu
logo, nem tempo teve para tocar. A Lebre arrancou também, pôs o pé no laço!, o
arame prendeu-a. Ai! Ela bem sacudia mas não havia maneira de conseguir
soltar-se... A Hiena aproximou-se, agarrou-a bem e disse:
–
Sobrinha! Apanhei-te.
A
Lebre respondeu:
– Ah,
tia, agora é que tu disseste uma grande verdade!
A
Hiena disse:
–
Vamos.
Carregou
a Lebre à cabeça e levou-a para casa. Ao chegar amarrou-a muito bem amarrada e
pô-la no chão.
Depois
saiu à procura de lenha e começou a juntar lenha que nunca mais acabava. A
seguir pôs-lhe fogo. Quando as brasas todas acabaram de arder, aquela lenha
toda já queimada formava um monte de brasas gigantesco. Foi nessa altura que a
Hiena foi buscar a Lebre para a ir deitar ao lume. A Lebre perguntou:
– Eh,
tia, para onde é que me vais levar?
–
Para dentro daquele fogo que estás ali a ver, naquelas brasas, é ali que te vou
pôr.
–
Tchi! — disse a Lebre. — Não precisavas de te preocupar tanto! Se me tivesses
dito há mais tempo, não terias tido esse trabalho todo, carregar lenha, queimar
isso tudo...Olha bem como os meus olhos são vermelhos. Estás a ver?
–
Sim, — respondeu a Hiena.
–
Bom, é que eu nasci no fogo. Se me pões lá não me acontece nada. O melhor é
pores-me no capim, aí sim que o relento dá cabo de mim.
A
Hiena, burra, não deitou a Lebre ao fogo e foi lançá-la no capim. Mal caiu no
capim, a Lebre deu um salto e fugiu enquanto dizia:
–
Bom, tia, então até qualquer dia.”
Gostaste?
Então, até terça-feira para novo País, nova história!