Faz hoje exatamente 100 anos que nasceu Eugénio de Andrade!
A 19 de janeiro de 1923, nascia, na freguesia de
Póvoa de Atalaia, no Fundão, este poeta, José Fontinhas de seu verdadeiro nome, filho dos camponeses Maria dos Anjos Fontinhas (Atalaia do
Campo, 08-06-1901 – Lisboa, 14-04-1956, vítima de cancro do pulmão) e de Alexandre Infante Rato (Póvoa de
Atalaia, 21-11-1903 – Lisboa, 11-11-1968).
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Eugénio de Andrade no Fundão |
Devido à separação dos pais, vai
viver aos sete anos para Castelo Branco e aos dez anos para Lisboa, onde frequentará o Liceu Passos Manuel e a Escola Técnica Machado de Castro, tendo
escrito os seus primeiros poemas em 1936.
Em 1938, aos 15 anos, envia alguns desses poemas a António Botto que, tendo gostado do que leu, o quis conhecer,
encorajando-lhe a produção literária.
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O jovem Eugénio de Andrade |
Assim, em 1940, com 17 anos de idade,
José Fontinhas publica “Narciso” (escrito em 1939), poema ao estilo de Botto e
homossexualmente explícito, uma estreia que depressa achou embaraçosa.
Em 1942, já então sob o pseudónimo de
Eugénio de Andrade, publica “Adolescente”. A
sua consagração acontece mais tarde, em 1948, com a publicação de “As mãos e os frutos”,
que mereceu os aplausos de críticos como Jorge
de Sena ou Vitorino Nemésio.
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Eugénio de Andrade no Porto |
Colabora ainda, entre 1946 e 1948, no
semanário Mundo Literário.
Em 1943 muda-se para Coimbra, onde regressará depois de
cumprido o serviço militar, convivendo então com Miguel Torga e Eduardo
Lourenço. Torna-se funcionário público em 1947, exercendo durante 35 anos
as funções de Inspetor Administrativo do Ministério da Saúde.
Uma transferência de serviço levá-lo-á a instalar-se no Porto em
1950, na Rua Duque de Palmela, 111 –
2.º, casa que só deixará mais de quatro décadas depois, quando se mudar para o
edifício da Fundação Eugénio de Andrade,
na Rua do Passeio Alegre, 584, na Foz do Douro, extinta já depois do seu
falecimento.Extinta Fundação Eugénio de Andrade
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Eugénio de Andrade na varanda da Fundação com o seu nome |
Ao longo da vida, Eugénio de Andrade
fez diversas viagens, foi convidado para participar em vários eventos e travou
amizade com muitas personalidades da cultura portuguesa e estrangeira, tais como
Joel Serrão, Miguel Torga, Afonso Duarte, Carlos Oliveira, Eduardo Lourenço,
Joaquim Namorado, Sophia de Mello Breyner Andresen, Agustina Bessa Luís,
Teixeira de Pascoaes, Vitorino Nemésio, Jorge de Sena, Mário Cesariny, José
Luís Cano, Ángel Crespo, Luis Cernuda, Jaime Montestrela, Marguerite Yourcenar,
Herberto Hélder ou Óscar Lopes, entre outros.
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Herberto Hélder, Eugénio de Andrade e Fernando Assis Pacheco |
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Agustina Bessa-Luís, Sophia de Mello Breyner e Eugénio de Andrade |
Apesar de enorme prestígio nacional e internacional, Eugénio de Andrade viveu sempre distanciado da chamada vida social, literária ou mundana, tendo o próprio justificado as suas raras aparições públicas com “essa debilidade do coração que é a amizade”.
A obra poética de Eugénio de Andrade
é essencialmente lírica, considerada por José
Saramago como uma “poesia do corpo a
que chega mediante uma depuração contínua”.
As Palavras
São
como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.
Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.
Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.
Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?
Foi também tradutor de algumas obras dos
espanhóis Federico García Lorca e Antonio Buero Vallejo, da poetisa grega
clássica Safo (Poemas e fragmentos, em 1974), do grego moderno Yannis Ritsos,
do francês René Char e do argentino Jorge Luís Borges.
Eugénio de Andrade por Emerenciano
Eugénio de Andrade morre a 13 de junho de 2005, no Porto, de paragem cardíaca após prolongada doença degenerativa neuro-muscular, sendo sepultado no Cemitério do Prado do Repouso, na mesma cidade. A sua campa é rasa, em mármore branco, desenhada pelo arquiteto Siza Vieira, seu amigo, revestida com versos do seu livro “As Mãos e os Frutos”.
Estas foram algumas das distinções que lhe atribuíram:
Grande-Oficial da Antiga, Nobilíssima e Esclarecida Ordem Militar de
Sant'Iago da Espada, do Mérito Científico, Literário e Artístico (1982);
Prémio Seiva de Literatura (1983);
Prémio da Associação Internacional de Críticos Literários (1985);
Prémio D. Dinis da Fundação Casa de Mateus (1987);
Grande Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores (1988);
Grã-Cruz da Ordem do Mérito (1989);
Grande Prémio Vida Literária APE/CGD (2000);
Prémio Camões
(2001);
Prémio P.E.N. Clube Português de
Poesia (2002);
Medalha de Mérito Cultural (2004).
Eugénio de Andrade por Júlio Resende (1993)
Tem, ainda, com o seu nome, uma biblioteca
no Fundão e um Agrupamento de Escolas no Porto.
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Biblioteca no Fundão |
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Biblioteca no Fundão |
PROSA
Os afluentes do silêncio (1950)
História da égua
branca (1976) com ilustrações
de Manuela Bacelar
Rosto precário (1979)
À sombra da memória (1993)
POESIA
Narciso, José Fontinhas (1940)
Adolescente, (1942)
Pureza (1945)
As māos e os frutos (1948)
Os amantes sem dinheiro (1950)
As palavras
interditas (1951)
Até amanhā (1956)
Coraçāo do dia (1958)
Mar de setembro (1961)
Obstinato rigore (1964)
Obscuro domínio (1971)
Véspera da água (1973)
Escrita da terra e outros epitáfios (1974)
Limiar dos pássaros (1976)
Memória doutro rio (1978)
Matéria solar (1980)
O peso da sombra (1982)
Branco no branco (1984)
Aquela nuvem e
outras (1986)
Contra a obscuridade (1987)
Vertentes do olhar (1987)
O outro nome da terra (1988)
Rente ao dizer (1992)
Ofício de paciência (1994)
O sal da língua (1995)
Lugares do lume (1998)
Os sulcos da sede (2001) prémio de poesia do Pen Clube Português (2003)
Poesia e prosa (1940-1979) (1980)
Poesia e prosa (1940-1980) (1981)
Poesia e prosa (1940-1986) (1987)